Reproduzo aqui o manifesto de Ciro Lilla, proprietário da importadora Mistral, sobre as salvaguardas. Excelente!
No dia 28 de Junho aconteceu em Brasilia a audiência pública sobre o processo de salvaguardas contra o vinho importado, aberto a pedido dos grandes produtores gaúchos. Após escutar as apresentações dos advogados das partes envolvidas no processo, chega-se facilmente à conclusão de que essa medida não pode prosperar.
O processo apresentado pelos produtores gaúchos é repleto de erros, afirmações e dados equivocados — e, principalmente, não atende em absoluto os requisitos mínimos exigidos pelos acordos da Organização Mundial do Comércio (OMC) para a adoção de salvaguardas. Dessa forma, a adoção das salvaguardas representaria uma violência jurídica que prejudicaria os consumidores, comprometeria o País e seria fatalmente derrubada na OMC. Como já dissemos antes, a adoção das salvaguardas seria uma desgraça para o vinho no Brasil, inclusive para o vinho brasileiro, já que o consumidor não perdoaria os responsáveis por essa medida desastrada.
Mas o que virá depois, se as salvaguardas não forem adotadas — como acreditamos que não serão, por absoluta falta de bases sólidas para sua adoção?
Gostaria de fazer um apelo aos produtores gaúchos e suas lideranças no sentido de evitar a tentativa de criar de novas barreiras para o vinho importado. Na realidade, o vinho importado é o maior aliado do vinho nacional na luta contra o baixo consumo de vinhos no nosso país — este sim o grande problema a ser enfrentado. A ABBA e a ABRABE — associações que representam os importadores — e a ABRAS — que representa os supermercados, o grande canal de distribuição dos vinhos nacionais — apresentaram uma proposta que prevê a criação de um grupo composto por representantes dos segmentos envolvidos na produção, importação e distribuição do vinho no Brasil, com o objetivo de unir esforços para aumentar o consumo dos atuais 1.9 litros por habitante por ano para pelo menos 2.5 l/h/a no período de três anos. Esse aumento resolveria os problemas de que se queixam os produtores gaúchos neste momento.
Propõe-se também a eliminação do entulho burocrático representado por medidas como a selagem para vinhos finos, as análises desnecessárias dos vinhos que chegam ao Brasil e outras burocracias que encarecem o vinho brasileiro. Em lugar destes procedimentos inúteis, seria criado um fundo para incentivo ao consumo de vinhos, gerido por esses representantes. Propõe-se enfim um jogo de "ganha-ganha", em substituição ao atual jogo de "perde-perde", em que tudo o que se objetiva é perder menos do que o vizinho.
Os produtores nacionais se manifestaram publicamente nos últimos meses contra o aumento de impostos para os vinhos importados, já tão fortemente taxados. Não temos porque não acreditar na sinceridade dessas declarações. Seria péssimo se, ao serem negadas as salvaguardas, houvesse em seguida um aumento do imposto de importação. Da mesma forma, seria muito ruim para o mundo do vinho se tivéssemos novas barreiras burocráticas — entraves que, como já explicamos tantas vezes, só afetam a importação dos vinhos de pequena produção e alto valor. Esses vinhos especiais, além de não competirem com o vinho nacional, são os que mais promovem o consumo do "produto vinho". É a oferta e a variedade que permitem ao consumidor escolher seu vinho, degustar e se apaixonar por esse produto nobre e saudável. O consumidor brasileiro não aceita mais dessas medidas que só encarecem ainda mais o vinho em nosso país.
É muito evidente que, em seu estágio atual, o que o mercado brasileiro de vinhos precisa é de um grande aumento do consumo, que é muito pequeno, e não de mais restrições.
Fica aqui portanto uma apelo pela adoção de uma agenda positiva, que lute pelo aumento do consumo e por uma redução nos preços dos vinhos, tanto nacionais como importados. Vamos dar uma chance ao vinho e, de uma vez por todas, assumir que os bons vinhos importados e os vinhos nacionais são aliados, e não inimigos. E vamos parar de assistir, impávidos, ao aumento explosivo do consumo de outras bebidas, como a cerveja e o uísque, enquanto o consumo de vinhos fica estagnado, vítima da luta contínua contra o vinho importado.
Vamos nos unir pelo vinho!
Ciro de Campos Lilla
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