Aqui você já entra aprendendo, o feminino de sommelier é sommelière, então não estranhe o nome do blog e nem pense que está errado!
Resolvi criar esse blog como uma maneira de dividir informações preciosas com apaixonados pela arte de Bacco. Aqui vocês encontraram alguns textos meus e outros que eu garimpo por ai e julgo itneressantes para dividir com vocês!
Entre. leia, se apaixone e fique a vontade, a casa é sua!

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Armando Peterlongo – Uma trajetória regada a champanhe

Não é qualquer vinícola que tem o direito de ostentar em seus rótulos a denominação ‘champagne’. Como não é qualquer cantina que pode dizer que produziu o primeiro champanhe do Brasil. Pois, a Vinícola Peterlongo é reconhecida pelos dois feitos. Tudo isso graças ao sonho de um dos seus fundadores, Armando Peterlongo, que herdou do patriarca Manoel a vontade de elaborar a ‘bebida dos deuses’. A história de ser reconhecida como a primeira e única vinícola no país a adotar as técnicas de elaboração para o champanhe remota do final do século XIX. Em 1890, o imigrante italiano – vindo da região do Trento – Manoel Peterlongo desembarcou no Brasil, mais precisamente na vila de Conde D’Eu, atual Garibaldi. O italiano trouxe na bagagem o sonho de produzir em terras brasileiras vinhos da mesma qualidade dos europeus. Engenheiro agrimensor por formação, vivia de seu trabalho, enquanto recebia instruções necessárias – vindas do Irmão Pacômio – para produzir vinhos por meio do método utilizado pelos franceses, o champenoise. Em 1913, chegava ao mercado o primeiro champanhe brasileiro. Reconhecido nacionalmente com uma medalha de ouro na 1ª Exposição de Uvas, de Garibaldi. Manoel logo percebeu que o clima frio e intenso da região era próprio para a elaboração da bebida. Aos poucos, as mudas de videira viraram vinhedos e os vinhos para consumo próprio se expandiram. Em 1° de janeiro de 1915, estava fundada a Vinícola Armando Peterlongo & Cia Ltda, uma homenagem ao seu primogênito e sucessor de seu legado.


personalidades
Armando Peterlongo avalia seu produto. (Foto: Arquivo Vinícola Peterlongo)
Em terras brasileiras, Manoel casou-se com Regina Vivian, com quem teve noves filhos. Em 23 de fevereiro de 1899, nasceu seu único filho homem, Armando Peterlongo. O jovem acompanhou desde cedo os gostos do pai e dele herdou o sonho de elaborar champanhes e valorizar a mão de obra feminina. Estudou Farmácia em Porto Alegre e trabalhou como farmacêutico em Vacaria, até 1921. Nessa época, os negócios da família prosperavam e Manoel chamou Armando para ajudar nos trabalhos da vinícola. Com o falecimento do pai, em 1924, Armando assumiu sozinho o comando da Peterlongo.

Novas instalações
A frente dos negócios da família, Armando deu continuidade aos sonhos do pai. Em 1930, construiu novas instalações seguindo os padrões da região da Champagne, na França. A cantina foi erguida em pedra basáltica numa extensão de 10 mil metros quadrados, incluindo uma cave subterrânea toda em granito – nela ainda hoje estão armazenadas garrafas elaboradas pelo método champenoise. Como um homem meticuloso, Armando estava preparando a empresa para o salto que viria: a projeção do modesto negócio familiar para nível nacional. A champanhe nacional conquistava cada vez mais espaço e fazia sucesso por onde passava. O presidente do Brasil, Getúlio Vargas, servia a bebida em seus banquetes comemorativos. A própria rainha da Inglaterra, Elizabeth, ao visitar o país, provou o champanhe elaborado por Armando e o aprovou. Com a repercussão, o champanhe foi coroado como bebida oficial do país, servido em cerimônias e festas particulares. “A partir de 1930, nas solenidades oficiais, batismos de navios ou aviões, passou-se a fazer uso do champanha nacional Peterlongo”, escreveram Elvo Clemente e Maura Ungaretti em História de Garibaldi.

Armando via a produção aumentar gradativamente e passou a empregar mais funcionários para trabalhar em seus vinhedos e no interior das vinícolas. Contratava, principalmente, mulheres, o que era raro para a época. Conforme o Arquivo Municipal de Garibaldi, foi o primeiro empresário da região a pagar salário mínimo aos operários. Nos jornais, o diretor da empresa era descrito como “homem que sabia respeitar as leis deste país”.

Além do vinho
Como um homem visionário, Armando logo percebeu que a Peterlongo precisava exportar seus produtos. Em 1942, o champanhe foi comercializado para a rede de varejo Macy’s, em Nova York. Com isso, dava início a uma série de exportações que aumentariam a procura pela bebida e fariam a Peterlongo ampliar sua capacidade vinícola e abrir espaço para outros produtos. Nasciam os vinhos brancos e tintos, os conhaques e os uísques da vinícola Armando Peterlongo. Eram produzidas mais de 360 mil garrafas. Na década de 1950, algumas inovações foram feitas, inclusive na elaboração dos espumantes, que passaram a ser feitos também pelo método charmat.

Mas não era apenas no campo vitivinícola que Armando se destacava. Casado com a professora Addy Sabrosa desde 1924, e com quem teve as filhas Zeney e Eneida, contribuiu para a educação de Garibaldi. Sob a influência da esposa, que foi coordenadora da 4ª Coordenadoria Estadual de Educação, Armando pagava os salários de vários docentes para ampliar o acesso ao ensino. Além disso, ajudou na construção do Colégio Carlos Gomes.

Também atuou na esfera política. Foi candidato a prefeito de Garibaldi em 1930 e eleito presidente da Liga de Defesa Nacional – órgão criado pelo governo federal durante a Segunda Guerra Mundial, no ano de 1941. Atuou ainda como vereador de Garibaldi, de 1947 a 1951; e concorreu a deputado estadual pelo partido Social Democrata.

Mas uma de suas paixões, além do champanhe, eram as atividades agropecuárias. Em documento do Arquivo Histórico Municipal de Garibaldi está escrito: “Amava a terra e as lides de campo. Em 1951, comprou um fazenda em São Gerônimo, com 4.250 hectares, começando, paralelamente à vinícola, a produção de carne, lã e arroz. Atendendo aos apelos do governo da época para que houvesse um aumento de produção no setor da alimentação, Armando resolveu dedicar-se ao plantio de arroz. Desta forma criou mais possibilidades de trabalho na região onde se localizava a sua fazenda”. Em outro documento, está relatado: “uma pessoa digna, com personalidade marcante, que além de ajudar as pessoas que o cercavam, ajudou a construir a história de Garibaldi”.

O empreendedor Armando faleceu em 6 de agosto de 1966, aos 67 anos, durante uma viagem de férias com sua família, na Itália. Seus familiares deram continuidade ao seu legado vitivinícola, herdado de seu pai e marcado pelo glamour de ter elaborado o primeiro champanhe do Brasil.

Fontes
Vinícola Peterlongo/ Arquivo Histórico Municipal de Garibaldi/ História de Garibaldi: 1870-1993, de Elvo Clemente e Maura Ungaretti.